Madame Carlota havia acertado tudo, Macabéa estava
espantada. Só então vira que a sua vida era uma miséria. Teve vontade de chorar
ao ver o seu lado oposto, ela que, como eu disse, até então se julgava feliz.
Saiu da casa da cartomante aos tropeços e parou no
beco escurecido pelo crepúsculo – crepúsculo que é hora de ninguém. (…) Macabéa
ficou um pouco aturdida sem saber se atravessaria a rua pois sua vida já estava
mudada. E mudada por palavras – desde Moisés se sabe que a palavra é divina. Até
para atravessar a rua ela já era outra pessoa. Uma pessoa grávida de futuro. Sentia
em si uma esperança tão violenta como jamais sentira tamanho desespero. Se não
era mais ela mesma, isso significava uma perda que valia por um ganho. Assim como
havia sentença de morte, a cartomante lhe decretara sentença de vida. Tudo de
repente era muito e muito e tão amplo que ela sentiu vontade de chorar. Mas não
chorou: seus olhos faiscavam como o sol que morria.
Então, ao dar o passo de descida da calçada para
atravessar a rua, o Destino (explosão) sussurrou veloz e guloso: é agora, é já,
chegou a minha vez!
Clarice Lispector. A hora da estrela
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